Certo dia, um homem muito intelectual portador de vários diplomas, um Phd, encontrou com certo rabino que não consigo lembrar o nome, mas o boato acerca de tal rabino era que ele conhecia muito bem o caminho da graça, do perdão e do amor. Conversar com ele era como ouvir palavras inaudíveis, perceber atitudes surpreendentes, ver aquilo que os olhos jamais contemplaram.
Este rabino, que não lembro o nome, viveu aqui pouco mais de trinta anos. Ele fez alguns discípulos e dizem até que ressuscitou mortos, curou enfermos, expeliu demônios, fez coisas inacreditáveis.
Não é de se admirar que um homem com tamanho poder seria capaz de fazer discípulos. Conta-se a história que milhares de pessoas aderiram ao projeto de discipulado ensinado pelo rabino. E, até os dias de hoje, milhares de pessoas vivem na expectativa de vivenciar este discipulado.
O homem muito bem instruído, Phd em uma área que também desconheço, fez uma pergunta um tanto capciosa ao tão magnífico rabino.
A pergunta foi: Como ser um bom pastor?
O Rabino logo se voltou para o Phd, admirado por tal pergunta e propôs uma parábola.
Certo dia, um pastor estava a cuidar de suas ovelhas, como fazia corriqueiramente, em busca de água, pastos verdejantes e campos repletos de tudo o que as mesmas precisavam para sobreviver. Ele as conduzia as águas tranqüilas em busca sempre de paz e refrigério.
Mas, como todo pastor, ele corria os riscos sempre evidentes do vale da sombra e da morte. Vale este, que está localizado logo à frente, um pouco mais adiante, onde todo pastor e suas ovelhas hão de passar. Será inevitável, não existe um atalho, não se pode mudar a rota, é um único caminho. É o caminho da vida!
É a vida e seus emaranhados, suas implicações, suas reviravoltas, astúcias, engrenagens, sutilezas... Esta é a vida, que só pode ser vivida uma única vez. A oportunidade está diante de ti, de viver com intensidade e ser feliz. É sempre bom lembrar que esta vida é breve, passa muito rápido e se não for aproveitada, quando chegar ao final, só restará cantar Epitáfio: “Devia ter amado mais, ter chorado mais, ter visto o sol nascer, devia ter arriscado mais, e até errado mais, ter feito o que eu queria fazer... Queria ter aceitado, a vida como ela é, a cada um cabe alegrias, e a tristeza que vier...”
O que de fato aconteceu foi que, ao passar pelo caminho da vida, no vale da sombra e da morte, que é um local, muito arriscado, ladeirado, uma estrada bem estreita e íngreme, cheias de curvas, este pastor, na labuta por suas ovelhas, por algum motivo se descuidou e escorregou caindo no despenhadeiro. Por milagre, conseguiu, com seu cajado pastoral, se agarrar em alguns ramos e ficou pendurado.
Ali estava um pastor ferido. Suas ovelhas, sem muito entender, ficaram abismadas, confusas, querendo salvar seu pastor querido, mas as mesmas não obtêm dos recursos necessários para ajudá-lo. Elas choravam, gritavam por socorro: “não podemos perder o nosso pastor, mas não sabemos como salvá-lo”. Elas bem que se esforçaram, mas o trabalho foi inútil! A cada momento que passava o pastor ferido se distanciava um pouco mais de suas ovelhas... Os ramos que prendiam o cajado estavam cada vez mais frágeis e, aos poucos, se soltavam do chão, não restando muito tempo ao pastor ferido. O abismo o esperava, o vale seria realmente sombrio e mortífero.

Mas, naquele instante, um pastor de grande eloqüência, um exímio pregador, um sacerdote de fato, estava a passar pelo mesmo caminho. As ovelhas se alegram, pois perceberam pelas vestes e pelo fato dele está com uma Bíblia em mãos, que aquele homem era um pastor. Logo, elas se agitaram e fizeram de tudo para chamar-lhe sua atenção, pedindo ajuda. Porém, o pastor sacerdote tinha suas obrigações com a instituição. Ele não podia parar. Iria se atrasar... Já estava no horário do culto, centenas de pessoas estavam a sua espera e, naquele dia, ele havia preparado o mais empolgante sermão de sua vida. Ele até parou, segurou na aba do seu terno italiano Dolce & Gabbana, consertou o nó de sua gravata importada Nina Ricci, percebeu que o seu sapato mocassim estava empoeirado precisando de um lustre antes mesmo de chegar à igreja, afinal de contas, aquela era um noite muito especial, pois o culto tinha como tema central a crucificação e ressurreição de Jesus Cristo. Ao se inclinar, viu o pastor ferido, mas não quis se comprometer. Aquele pastor ferido poderia lhe trazer prejuízos, atrasos, as pessoas poderiam falar mal do pastor ferido e se ele o ajudasse, também poderia ser alvo das críticas. Enfim, o pastor sacerdote preferiu não se envolver, escolheu ser imparcial, optou passar de largo, seguir seu caminho e esquecer que na caminhada da vida, um dia ele deparou-se com um pastor ferido caído à beira do caminho.
As ovelhas revoltadas não entendiam o porquê da indiferença, o que o impedia de estender o seu cajado, a sua Bíblia para ajudar o pastor ferido? Assim, se foi o pastor sacerdote, em busca de cumprir suas obrigações religiosas e “salvar” mais algumas almas para encher sua igreja de fiéis e acrescentar a entrada de dízimos no final do mês.
Desespero, angústia, dor e morte, afinal de contas, aquele era o vale da sombra e da morte. Não havia mais esperanças, as ovelhas não queriam sair de perto do seu pastor que aos poucos escorregava, não tendo mais forças para continuar segurando o seu cajado. Era como ver a morte chegando aos poucos: ele agonizava, chorava, lamentava, mas nada as ovelhas podiam fazer. É o fim! Sim o fim chegou! O vale é o caminho que aponta para a morte!
Algumas ovelhas já desistiam, outras não suportavam ouvir os gemidos do seu pastor ferido. O sentimento de impotência fazia com que as ovelhas se dispersassem sem destino e sem direção... Quando o pastor é ferido as ovelhas ficam perdidas, a mercê dos ataques de predadores, feras e falsos pastores.
Lágrimas são as expressões mais autênticas do desencanto.
Porém, “quero trazer à memória aquilo que me dá esperança”. (Lamentações 3:21)
Quando nada mais poderia ser feito, ver-se à distância alguém se aproximando. As ovelhas se alegram, acreditam que outro pastor está vindo e passará pelo caminho. Mas, ao se aproximar, o desânimo toma conta das ovelhas, pois o homem não tem aspecto de pastor. Ele não carrega uma Bíblia, mas sim uma prancha de surf; ele não está de terno e gravata importada, está de short; não está usando sapato mocassim, está descalço, pés na areia. Se um pastor oficial do sacerdócio não se importou com o seu “amigo” ferido, imagine só, se um homem com aspecto diferente dará a mínima atenção?
Realmente, aquele homem não tinha aspecto de pastor sacerdote, mas para surpresa de todos, ele era um discípulo de Jesus. Aprendeu com os ensinamentos do Cristo, a cuidar, respeitar, proteger, integrar, amar e jamais abandonar alguém na caminhada da vida, principalmente, se este alguém estiver no vale da sombra e da morte.
Este discípulo se recusa a ser chamado de pastor sacerdote, pois não compreende o ministério pastoral como meio de sobrevivência e sim como fonte de vida e graça, inclina sua prancha de surf para que o pastor ferido segure e seja trazido de volta à vida. Ele se envolve com o pastor ferido, não querendo saber quais as causas das feridas, quer apenas curar suas chagas e oferece afeto, atenção e amor. Este discípulo pode ser aqui chamado de pastor amigo!
Este pastor amigo, não se importa com falácias e possíveis críticas que podem ser feitas ao pastor ferido e que, por conseqüência, poderiam lhe atingir também. Ele se envolve com a vida, gera vida, protege a vida e possibilita ao pastor ferido, ser curado, restaurado e renovado, para que o mesmo prossiga na caminhada da vida, com mais cuidado e tendo em seu coração, a certeza de jamais deixar alguém caído à beira do caminho.
O rabino então conclui a parábola fazendo a seguinte pergunta ao Phd: Para você, qual dos dois pastores foi um bom pastor, o pastor sacerdote ou o pastor amigo?
O Phd responde: O pastor amigo!
O rabino então conclui: Você realmente é muito inteligente! Vá e haja sempre desta maneira!! Nunca, jamais, em hipótese alguma, deixe alguém caído à beira do caminho!
A proposta do Reino de Deus é justamente esta: está ao lado daqueles que, por algum ou qualquer motivo, foram esquecidos, desprezados, rejeitados a beira do caminho da vida.
Agora eu quero lhes perguntar: O seu pastor é sacerdote ou amigo?
Ildeilson Santos.